Uma evidência dos meus últimos dias, é o facto de os saltos altos voltarem a ocupar 70% do meu dia.
Isto significa que voltei a ver mais alto. Muitas vezes mesmo, de cima para baixo. Esta atitude revela um misto de elegância e prepotência do mundo adulto, mas sobretudo, do meio profissional.
De saltos altos é mais fácil impôrmos a nossa presença. A barriga das pernas fica mais torneada, a postura é obrigada a mostrar-se firme, o porte torna-se mais solene e, sobretuto, a atitude tem de revelar confiança. Isto não é fácil e comporta algum esforço e disciplina física. Porém, estes tornam-nos mais resistentes (depois de um dia inteiro de reuniões e apresentações em saltos altos, qualquer projecto megalómano que surja é alpista). Por outro lado, justificam alguma assertividade das nossas orações e o nosso discurso directivo (pois precisamos de nos despachar até encontrar o assento mais próximo).
Uma outra vantagem prende-se com o poder vocal que se adquire. Como estamos mais altas, ganhamos vantagem com a acústica e, como tal, também nos ouvem melhor. Um "Fui clara?..." sobre salto alto é bem mais esclarecedor do que o mesmo "Fui clara?..." sobre uma sabrina.
Além de tudo isto, a profissional em salto alto é extremamente focada. Não perdoa margem para desvios ou distracções. Qualquer percalço poderá traí-la com uma queda embaraçosa que comprometeria todo um esforço que durara desde as sete da manhã (hábitos da Cinderela moderna).
Posto isto, cuidado, voltei à visão panorâmica. Temam por decisões vindouras.
Mas, é claro, no final do dia, arrumo os saltos.
Descalço-me, meto-me de gatas, de joelhos, sem que qualquer constrangimento me limite ou me entedie. Olho para os meus filhos e deixo de ver o mundo do alto para voltar a ver um mundo melhor.